O que é a paralisia cerebral? É uma doença? Quais são os sintomas? Como ter um diagnóstico? Quais as maiores dificuldades? E qual é a melhor parte? Que perguntas fazer?
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Se chegaste até aqui é porque tens no colo, ou na família, uma criança com paralisia cerebral.

Antes de tudo, parabéns por essa criança maravilhosa e por todas as coisas fascinantes que trouxe à tua vida. Se estás no meio da rebentação das ondas, a engolir pirulitos de água salgada, haverá sempre momentos de ir à tona respirar. Que encontres sempre espaço para a celebração. Aproveita-os muito.

Se estás numa fase inicial do diagnóstico com o futuro a parecer diferente do que esperavas quero pedir-te que nunca esqueças que não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe. E não fui eu que o disse, foi a sabedoria popular!

O tempo e a experiência vão trazer-te a sabedoria necessária para processar as emoções, compreender melhor o que é esta coisa da paralisia cerebral e aprender sobre as terapias.

7 coisas que precisas de saber sobre paralisia cerebral

A OMS diz-nos que a paralisia cerebral é a deficiência motora mais comum na infância. 

Não acho que este facto a torne menos assustadora no momento do diagnóstico, mas quando as emoções dão tréguas é possível ver para além disso e compreender a sua vastidão.

A paralisia cerebral não é uma doença, é uma condição que inclui um conjunto de distúrbios que provêm de uma lesão permanente e não-evolutiva no cérebro. Estes distúrbios afetam a capacidade de uma pessoa se mover, controlar os músculos e manter o equilíbrio e a postura. 

Não há cura para a paralisia cerebral, mas o tratamento pode melhorar a qualidade de vida.

A paralisia cerebral afecta o tónus muscular e pode provocar a perda de equilíbrio, falta de coordenação, movimentos involuntários ou dificuldade a falar ou a caminhar.

Cada criança é uma criança, cada caso é um caso. O que significa que os sintomas podem variar muito, muito. Pode provocar desde uma falta de coordenação motora quase imperceptível, a uma dificuldade significativa em mover alguns membros ou até mesmo uma rigidez tão grande nas articulações que as impede de se movimentarem. 

Pode ter outras condições associadas, conforme a extensão da lesão cerebral, mas depende de pessoa para pessoa.

O diagnóstico virá para cima da mesa quando se verificar, por exemplo, espasticidade (rigidez muscular e reflexos exagerados) ou a falta de coordenação, um atraso a desenvolver capacidades motoras ou a aprender a andar.

Com os exames de imagem cerebral a equipa médica vai poder ver a origem dos sintomas, verificar a extensão da lesão e traçar um plano de atuação a curto prazo.

A aquisição de competências da criança ao longo do tempo é que vai ditar os ajustes ao plano. O acompanhamento é feito pelo neuropediatra em conjunto com os médicos e terapeutas adequados às necessidades da criança. Esta dream team vai sugerir as terapias mais adequadas e a necessidade ou não de equipamentos de apoio (cadeiras de rodas, material adaptado, talas e etc e tal).

O Tomás é uma pessoa de pessoas. E gosta de saber o nome de todas as pessoas e de todas as coisas. É óptimo a desconversar, sobretudo quando as terapias não estão a ser exactamente como ele gostava. Está a valer todo o jogo de cintura dos terapeutas. 

É mais resiliente do que eu e já desenvolveu montes de estratégias que o ajudam a desenrascar-se quando precisa. Gosta de abraços, ama uma boa sopa, adora inventar histórias e fazer role-play.

As terapias começaram muito cedo (algumas ainda o Tomás estava na incubadora). E isso permitiu-nos acompanhar muito de perto a evolução das competências, com outros olhos, com os inputs dos terapeutas.

Os exames de rastreio, como por exemplo a ecografia transfontanelar, já indicaram qualquer coisa. Daí partimos para uma ressonância magnética, onde tivemos o diagnóstico.

Nos primeiros 2 anos eu senti uma pressão enorme, enorme, enorme (e não haverá repetição suficiente para retratar o que eu sentia).

As tabelas de desenvolvimento, alguns profissionais de saúde, os livros e a sociedade põem-nos um relógio com um tic-tac por cima da cabeça com as aquisições que cada criança tem de conseguir. 

E mesmo consciente disso e tentando ignorar, eu sentia uma pressão sobre a janela de tempo dos 2 anos, como sendo o período em que ele ia conseguir ou não adquirir competências. Quando, no fim do dia, o ritmo de desenvolvimento de cada criança é que manda, e muitas vezes só com o ganho das competências é que se percebe que se tem de trabalhar determinado aspecto.

Há fases tramadas em que parece que as coisas não evoluem, que as terapias não fazem efeito. Outras parece que os sucessos surgem de um dia para o outro. Surgem como que por magia, como se não fossem fruto de dias, semanas, até meses de trabalho. E são momentos bonitos, de superação e celebração.

No meio disto tudo, é só preciso fazer também aquele exercício de não esquecer que uma criança com uma deficiência, qualquer que seja ela, é uma criança e vai ter as mesmas necessidades de brincar e interagir. Com mais ou menos competência física.

No presente:

  • A sub e a sobre valorização: quando duvidam que ele consiga atingir uma meta sem lhe darem oportunidade, quando exageram em festejar competências mais do que adquiridas, ou lhe falam de forma condescendente.

  • O olhar de pena. Aquele olhar prolongado pelo canto do olho, aquele que dá uma cotovelada à pessoa que vai ao lado, o que apressa o passo e o que pára boquiaberto. Todos vêm acompanhados de pena e eu já não sou a única a senti-los. Se por cada olhar de pena, lhe mostrassem um sorriso, ganhávamos todos o dia.

  • A falta de acessibilidade existente na sociedade. Tanto de forma figurativa (no pensamento das pessoas) como física, pela falta de condições de acesso a espaços.

Penso também nos insultos gratuitos que possa vir a receber só pela descoordenação motora, sem o conhecerem de verdade. Nas barreiras que vai encontrar na sociedade e no impacto que isso terá nele. E em como a limitação física poderá afectar as relações dele. 

Pego nisto tudo e trago para a educação do Tomás todo o conhecimento e valores que lhe consigo transmitir, para o preparar o melhor possível para a vida.

O meu filho traz tudo de bom que todas as crianças trazem aos seus pais. O Tomás é perfeito, tal como ele é. Com o extra de ser um íman de carinho. Desde que ele nasceu, a minha vida foi inundada por bondade e carinho, que muitas vezes aparecem de onde menos espero. 

Trouxe-me também uma mente mais aberta. No momento do diagnóstico fazemos tábua rasa às competências que podem vir a ser adquiridas. Porque é possível que ele ganhe certas competências, outras não ou até que demorem mais tempo a vir, sendo preciso mais trabalho até lá chegar.

E assim parei de fazer suposições sobre qualquer coisa. Qualquer mãe ou pai cria uma expectativa de quando e como o desenvolvimento dos filhos se vai desenrolar. Mas quando se desfragmentam essas expectativas, somos postos à prova perante um presente muito intenso que conduz a uma grande celebração da vida, com uma curiosidade diária de saber: “que novos desafios vais conquistar hoje?”.

Todas as dúvidas que surgem são válidas para uma conversa útil e construtiva com a equipa médica. Na dúvida, pergunta sempre que algum tema ou conceito não esteja claro para ti.

Podes incluir outros, como:

  • Se estiverem vários profissionais de saúde envolvidos no diagnóstico, questionar a possibilidade de estarem todos juntos numa consulta para que possam trocar impressões/clarificar questões que existam.
  • Fazer aquele check pontual da situação à data, para ouvires pelas palavras dos profissionais de saúde o que é possível observar nas competências adquiridas e nos exames realizados.
  • Em consciência de que não há bolas de cristal – qual é a evolução expectável e que competências têm de ser mais trabalhadas?
  • Isso vai ajudar a perceber quais os estímulos a proporcionar. Independentemente dos estímulos que queres dar à tua criança e que qualquer criança deve receber de acordo com as suas competências, os terapeutas têm sempre boas dicas de actividades que podem ajudar a estimular as actividades do dia-a-dia. Que são sempre bem mais interessantes para as crianças do que qualquer terapia.

Se / quando te fizer sentido, não deixes de lado a oportunidade de conhecer outras famílias, com um contexto semelhante.

Dizer-te ainda que estas informações são com base no conhecimento que fui juntando ao longo do tempo. Muita leitura e conversas com profissionais de saúde. São descrições de mãe, com linguagem de mãe não-médica, que inclui palavrões médico-técnicos que com o tempo já adoptei como meus.